5 de mai. de 2008

BDSM no Divã - Um Comentário

Nas andanças pela net encontrei um excelente blog sobre BDSM onde escrevi um comentário sobre o tópico BDSM no Divã, escrito já há algum tempo, tempo suficiente para que o autor encontrasse uma profissional ética e competente.
Ainda assim, valem os esclarecimentos feitos lá:

Posso, e acho que devo, falar em nome da psicanálise.
No título do tópico consta o divã, dispositivo específico do tratamento psicanalítico.


Algumas distinções previamente importantes:

Psiquiatra: profissional formado em Universidade de Medicina que optou por tratar alterações mentais e bioquímica cerebral. É o médico mais indicado a prescrever medicação psicotrópica (ansiolítico, anti-depressivo, barbitúrico, anti-psicótico, etc.), pois sabe a indicação e dosagem corretas para cada caso.

Psicólogo: profissional formado em Universidade de Psicologia. Pode atuar na área escolar, recursos humanos, institucional, hospitalar e clínica (consultório-psicoterapia).

Psicanalista: psicólogo ou médico que faz especialização em psicanálise, incluindo análise pessoal, estudo teórico e atendimento supervisionado. Essa “preparação” é permanente, já que seu principal pilar é uma formação do inconsciente que produz um psicanalista. Trabalha em consultório.

A psicanálise foi construída há mais de 100 anos por Sigmund Freud e sustenta-se em seus conceitos fundamentais até hoje. Evidente que surgiram releituras do texto freudiano, algumas bastante ricas como a de Jacques Lacan, que promoveram uma precisão da teoria e da práxis psicanalítica.

Isto posto, vamos ao ponto: Freud jamais separou qualitativamente os conceitos de normalidade e anormalidade, pelo contrário, seus estudos sempre apontaram que havia tão somente uma questão de intensidade, ou de quantidade! Ou seja, não há os normais e os anormais, há sim estruturas psíquicas distintas que podem ser mais ou menos afetadas por determinadas características. Disso ninguém se salva.

Uma das pedras angulares da obra freudiana é o conceito de pulsão, magnificamente descrito no texto “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade”, 1905, (em Obras Completas de S. Freud, ESB, Imago Editora).

Resumindo e simplificando muito aqui, o que ele diz nesse estudo é que o ser humano não tem o que se chama instinto sexual, ou seja, um comportamento padronizado como existe no reino animal. Para o ser humano não existe objeto, objetivo, nem alvo, determinado naturalmente. É constatável isso, mas foi revolucionário naquela época. Freud denomina pulsão isso que move e anima o ser humano sexualmente e que há tantas possibilidades de variações quanto há de indivíduos! Brilhantemente nesse livro, ele aproxima a sexualidade dita normal da pretensamente perversa, indicando que nos jogos preliminares e de sedução, por exemplo, há componentes voyer, exibicionista, sádico, oral, anal, etc, etc, etc
Sendo assim, todo e qualquer ser humano tem suas particulares preferências, condições, fetiches, que fazem despertar seu desejo. O fato de pertencer a uma maioria é uma questão estatística e questionável, ou alguém já conseguiu que os segredos das fantasias ou do que se faz na intimidade viessem claramente à tona para uma medição fidedigna?

Então o BDSM não deveria ser adjetivado como uma “forma de prazer alternativo”, mas simplesmente como uma forma de prazer como tantas outras.

Você (o autor do tópico citado) tem razão quando diz que muitos psicólogos e psiquiatras entenderão a preferência BDSM como algo a ser “corrigido”, assim como a homossexualidade, a bissexualidade, a castidade, a masturbação, etc. Essas duas disciplinas levam em conta o fenomenológico, o estatístico e o cultural, em detrimento da singularidade. E não são só eles! Muitos formadores de opinião, religiosos, pensadores, filósofos e os vizinhos vão ter suas opiniões balizadas e moldadas por seus referenciais. Certamente que os que se propõe a tratar do psiquismo não deveriam agir assim, mas não é o que acontece. Há algumas exceções no que cito aqui, claro.

Já a psicanálise tem como ética o desejo da estrita diferença, ou seja, o bem do sujeito nem sempre é o que se supõe que seja, só ele pode saber o melhor para si. Portanto um psicanalista de fato jamais julgaria ou tentaria “consertar” uma escolha, seja ela sexual, profissional, pessoal ou afetiva. Os adeptos de BDSM tem questões como qualquer um, que podem sim ser levadas a uma análise, como se levam quaisquer coisas (amor, dinheiro, família, relacionamentos, trabalho, angústia, tristeza). Se o(a) psicanalista julgar ou tentar enquadrar você, saia fora, esse profissional se diz psicanalista, mas não é!

Medicação, psicoterapia e psicanálise são tratamentos totalmente distintos em seus objetivos.

Enfim, concordo que é exigir demais que todo mundo entenda e aceite nossas escolhas, sejam em que âmbito for, às vezes é mais conveniente preservar-se. O que é da ordem da vida privada pode permanecer como tal, afinal ninguém sai contando o que faz nos bastidores.

Porém discordo (do que foi publicado no citado artigo) que os adeptos do BDSM não devam procurar um tratamento psicanalítico se assim o desejarem.

Só em uma análise pode-se falar tudo e qualquer coisa...


4 comentários:

Anônimo disse...

Muito boa essa sua postagem :)

Canal BDSM disse...

Que bom que gostou!
Seu blog tb é riquíssimo!

Unknown disse...

Desculpe, não achei um lugar bom para comentar, se desejar pode deletar este comentário.

Gostaria de pedir por gentileza para alterar o endereço do meu antigo site nos blogs relacionados:
http://www.gasmask.wordpress.com

Obrigado!

Canal BDSM disse...

Claro, GasMask, suas publicações podem, e devem, ser divulgadas!